MAIS R$0,50

Tarifa de ônibus em BH sobe o dobro da inflação nacional e é a mais cara das capitais do Sudeste

Especialistas analisam que reajuste pode pesar no bolso dos usuários e afastá-los do transporte coletivo

Tarifa de ônibus em BH sobe o dobro da inflação nacional e é a mais cara das capitais do Sudeste
Publicado em 28/12/2024 às 11:15

aumento de R$ 0,50 na tarifa dos ônibus convencionais e do Move em Belo Horizonte, a partir de quarta-feira (1º de janeiro de 2025), deve impactar o poder de compra dos usuários e afastá-los ainda mais do transporte coletivo. Especialistas em trânsito avaliam que o reajuste de quase 10% na tarifa – de R$ 5,25 para R$ 5,75 – é praticamente o dobro da inflação nacional dos últimos 12 meses (4,87%). Ou seja, os passageiros sentirão que a passagem encareceu mais em relação ao aumento das despesas essenciais, como alimentação e moradia. O acréscimo consolida BH como a capital do Sudeste com a maior tarifa de ônibus. A cidade mineira cobra 15% a mais pela passagem do que São Paulo, onde o custo será de R$ 5 por viagem a partir de janeiro.

Para moradores que utilizam dois ônibus convencionais por dia em Belo Horizonte, o custo mensal aumentará em R$ 31 a partir de janeiro – passando de R$ 325,50 para R$ 356,50. Esse aumento é o dobro do valor que seria aplicado caso o reajuste seguisse apenas a inflação nacional: o acréscimo seria de R$ 15,50, totalizando R$ 341 no mês. “Isso reflete no bolso do usuário de transporte coletivo em BH e na contribuição dos funcionários para o vale transporte. São reais a mais que pesam para quem pega ônibus todo dia útil ou até mais, nas escalas 6×1. O resultado de uma política tarifária alta é a exclusão social e espacial dos mais vulneráveis, que vão deixar de acessar a cidade por falta de dinheiro ou optar por opções mais em conta, como as motos por aplicativo”, pondera o economista e especialista em trânsito André Veloso. 

A perspectiva de impacto no comércio também preocupa a Câmara de Dirigentes Lojistas de Belo Horizonte (CDL/BH), que lamentou publicamente o reajuste da passagem em BH. Segundo o presidente da entidade, Marcelo de Souza e Silva, haverá consequência imediata nos caixas das empresas, uma vez que os lojistas precisarão arcar com custos que não estavam previstos. Além disso, Souza e Silva se preocupa com a limitação do poder de compra dos clientes. “Já vivemos um cenário em que as famílias estão mais cautelosas em relação ao consumo devido ao aumento dos preços de diversos produtos, inclusive os da cesta básica. Com este novo aumento da passagem, o orçamento se torna mais restrito e as pessoas tendem a reduzir o consumo, o que prejudica o desempenho do comércio, principal gerador de empregos da cidade”, argumenta.

“Está caro demais” e “vai nos prejudicar”: passageiros reclamam de reajuste em BH 

Para a manicure Glaucia Monteiro, pagar R$ 5,75 para pegar ônibus em Belo Horizonte não condiz com as condições do transporte coletivo na capital. “Nossa, tá caro demais. Outro dia mesmo, eu peguei ônibus com o ar condicionado soltando água. Nós temos que pagar impostos, água, luz, agora é esse aumento da tarifa. Não é fácil”, lamenta. A opinião é a mesma do autônomo João Emilian, de 44 anos: “o preço deveria, na verdade, diminuir. A qualidade deixa muito a desejar, esse preço já está acima do aceitável”, diz. 

“É absurdo. Além da passagem ser cara, nós não vemos melhorias. Eu já peguei ônibus que a embreagem estragou no meio da viagem, isso é inaceitável. Vai nos prejudicar demais ficar mais caro”, acrescenta a atendente de caixa Tauana Rodrigues, de 17 anos, na fila do Move na Cristiano Machado, na região Nordeste de BH.

A Prefeitura de Belo Horizonte explica que o reajuste, conforme determina a Lei 11.458/2023, respeita o cálculo de custeio do sistema feito pela Superintendência de Mobilidade (Sumob). A análise considera variáveis como combustível, lubrificantes, pneus e peças, além de despesas com pessoal, licenciamento e frota de veículos. Segundo o Executivo, a tarifa deveria chegar a R$ 9,40 na capital, mas é reduzida devido ao complemento do valor custeado pela prefeitura, por meio do subsídio de R$ 518,2 milhões às operadoras de transportes. “Desde que sejam seguidas as condicionantes previstas na legislação, como o cumprimento do quadro de horários, viagens e qualidade dos ônibus”, informa a PBH.

Passagem em BH mais cara que São Paulo e Rio: o que explica? 

O modelo de remuneração das empresas, adotado em 2023 em BH, prevê o pagamento por quilômetro rodado. No entanto, segundo o especialista André Veloso, que também integra o movimento Tarifa Zero, existem outras formas de manejar o sistema de transporte coletivo sem onerar tanto o bolso dos usuários. “Se a prefeitura está fazendo cálculos que indicam uma passagem acima de R$ 9, é necessário repensar a forma de contratação e gestão do sistema. É possível reduzir o custo sem repassar o valor para a população. No Rio de Janeiro, por exemplo, a licitação do BRT foi refeita de forma separada do sistema de ônibus; contratos com empresas onerosas foram desfeitos e as licitações estão sendo realizadas em garagens públicas, o que contribui para a redução de custos”, afirma Veloso. Na capital fluminense, a passagem de ônibus está fixada em R$ 4,30. Até o momento, não foi anunciado reajuste para 2025.

Sobre a tarifa em Belo Horizonte ser mais alta que nas demais capitais do Sudeste, o especialista em trânsito Silvestre de Andrade pondera que cada cidade possui condições particulares e, na capital mineira, as características do trânsito encarecem o serviço. “O valor reflete os custos do setor, que têm aumentado. São Paulo e Rio de Janeiro contam com subsídios expressivos e uma gama diversificada de transportes, como redes de metrô consolidadas. Em BH, além de uma maior dependência dos ônibus, enfrentamos desafios como o consumo elevado de combustível devido ao trânsito e ao relevo acidentado, que provoca maior desgaste dos veículos. Além disso, nos últimos anos, o número de usuários de transporte coletivo diminuiu significativamente na capital mineira. Isso encarece o serviço”, analisa.

Problema gerando problema: aumento da tarifa afasta usuários, sobrecarrega trânsito e vice-versa 

De fato, o abandono dos coletivos tem sido um movimento nacional. Conforme a pesquisa CNT de Mobilidade da População Urbana, de 2024, os ônibus deixaram de ser a principal opção de deslocamento para mais da metade dos brasileiros (56,9%) que utilizavam esse meio de transporte nos últimos sete anos. O preço da tarifa foi um dos motivos apontados pelos usuários para a substituição do ônibus. O resultado, segundo o especialista André Veloso, é paradoxal: quanto mais alta a passagem, maior o entrave no trânsito e mais caro se torna o transporte coletivo. 

Ele cita o colapso no trânsito na semana do Natal, devido ao excesso de veículos nas ruas, dificultando o deslocamento pela cidade. “Então, quando a tarifa de ônibus aumenta, o cenário piora, seja por falta de dinheiro, seja pela opção por outros meios de transporte. Cresce o uso de carros e motos, resultando nas consequências já conhecidas: mais acidentes, poluição, engarrafamentos e estresse”, afirma Veloso.

Procurado, o Sindicato das Empresas de Transporte de Passageiros de Belo Horizonte (SetraBH) não respondeu até o fechamento desta matéria. 

O que diz a PBH? 

A Prefeitura de Belo Horizonte (PBH) informou que, ao longo de 2023, 504 ônibus foram incorporados ao sistema, “todos com ar-condicionado e suspensão a ar, além de contar com tecnologia sustentável baseada no sistema Euro 6. Isso significa redução em até 80% da emissão de gases poluentes, além de garantir um transporte coletivo mais eficiente, moderno e sustentável”. 

Além dos ônibus, o Executivo afirma que foram incluídas novas viagens no sistema, que já contabiliza 23.985 viagens nos dias úteis, “reduzindo a lotação nos veículos”. Aos finais de semana e feriados foram acrescidas 615 viagens. Foram contempladas 221 linhas de ônibus, ou 74% do total. “Também foram criadas novas linhas e itinerários foram adequados para atender demandas dos usuários, especialmente para o deslocamento a postos de saúde”, informou a PBH. 

“A Prefeitura de Belo Horizonte ainda intensificou a fiscalização no transporte público para garantir a qualidade na prestação do serviço. Neste ano já foram realizadas 1.874 operações de fiscalização pelos agentes da Superintendência de Mobilidade de Belo Horizonte (Sumob), e os ônibus foram inspecionados 20.309 vezes.

Todas as viagens dos ônibus são monitoradas por GPS e os decêndios, com os demonstrativos da fiscalização e do pagamento da remuneração complementar às empresas, são publicados no site da Prefeitura, garantindo a transparência do sistema. Um canal de Whatsapp foi criado para as reclamações dos usuários que são apuradas em tempo real pelas equipes da Sumob”.