SAÚDE SOBRECARREGADA

Com Risoleta de porta fechada em BH, pacientes esperam no chão e em macas improvisadas: ‘revoltante’

Pronto-socorro suspendeu atendimentos por falta de estrutura e espaço para assistência; cirurgias eletivas estão suspensas

Com Risoleta de porta fechada em BH, pacientes esperam no chão e em macas improvisadas: ‘revoltante’
Publicado em 22/01/2025 às 18:18

O Hospital Risoleta Tolentino Neves, na região de Venda Nova, em Belo Horizonte, vive um cenário de caos nesta quarta-feira (22 de janeiro), após a interrupção do atendimento a novos pacientes devido à superlotação do pronto-socorro. Em meio à dor, revolta e sofrimento, muitos pacientes — alguns à espera há horas — clamam por atendimento e, em alguns casos, por socorro. Belo Horizonte enfrenta um colapso no sistema de saúde devido à “alta demanda por leitos ortopédicos de urgência”, segundo a prefeitura. Todas as cirurgias eletivas do tipo estão suspensas por duas semanas.

Jorge Eduardo Pinto, de 63 anos, armador da construção civil e morador do bairro São Benedito, em Santa Luzia, na região metropolitana de BH, é um dos pacientes surpreendidos pela suspensão dos atendimentos no Risoleta Neves. Deitado sobre um pedaço de papelão na porta do pronto-socorro e sentindo fortes dores, Jorge, que mora sozinho, chegou ao local às 8h. Ele relatou o desespero com a demora no atendimento. “Estou com falta de ar e, se ficar em pé e entrar, posso desmaiar por causa do calor. Por isso, preferi ficar do lado de fora, caso desmaie”, lamentou, conformado diante da situação caótica.

Em cadeira de rodas, paciente se revolta por falta de atendimento

Com um pé quebrado e sentada em uma cadeira de rodas, a cuidadora de idosos Paloma Mendes, de 44 anos, manifestou revolta com a demora no atendimento. Ela também chegou ao local pela manhã, em um carro de aplicativo, e foi abordada por um segurança do hospital assim que desembarcou. “Cheguei aqui e não tem atendimento para a gente. E o segurança ainda achou ruim porque o motorista parou o carro na porta. Eu não tenho condições nem de sair da cadeira de rodas”, reclamou. 

A cuidadora de idosos reforçou que depende do Sistema Único de Saúde (SUS) e, por isso, lamentou não ter previsão para ser atendida. “Acho uma falta de respeito o jeito que as coisas estão [na saúde pública]. Está superlotado. A saúde das pessoas não importa”, lamentou Paloma.

Irmão com fratura, moto roubada: prejuízo em dobro

Desde 1h da manhã desta quarta-feira (22 de janeiro), o alinhador e balanceador de carros Guilherme Augusto vive momentos de tensão. O irmão dele sofreu um acidente, teve uma fratura exposta e, para piorar, Guilherme teve a moto roubada do lado de fora do hospital. Ele relatou que o irmão, gritando de dor, foi colocado em uma maca, mas sem previsão de atendimento. “Tive que ajudar a colocá-lo na maca. Deixaram-no de lado, ninguém explica nada. Na hora da triagem, fui resolver a documentação dele e, em questão de 10 minutos, minha moto foi roubada”, conta.

O caso do irmão de Guilherme se enquadra nos atendimentos ortopédicos de urgência, exatamente o que tem causado sobrecarga no SUS-BH e no Risoleta Neves. “É revoltante, porque estou, até agora, esperando alguma notícia dele [o irmão internado]. Sempre que abrem a porta, vejo que ele está ali, no canto, jogado. Fica difícil, porque a gente, que é trabalhador, não tem a condição de pagar um convênio. Vem ao SUS esperando segurança e um bom atendimento. Não acontece, é só enrolação para a gente que trabalha”, lamentou Guilherme.

O que está acontecendo no Risoleta Neves? 

O Risoleta Neves interrompeu o atendimento a novos pacientes na manhã desta quarta-feira (22 de janeiro). A medida é crítica, pois o pronto-socorro da unidade é porta-aberta e deveria funcionar 24 horas sem restrições. Segundo a direção, uma superlotação saturou a capacidade assistencial do hospital. 

Segundo a diretoria do pronto-socorro de Venda Nova, a unidade está atendendo o dobro de pacientes em relação à capacidade assistencial. O Risoleta pode assistir até 90 pacientes simultaneamente, mas está com 180 usuários admitidos. “Desde 2023, o Pronto-Socorro vive com superlotação. Esta é a primeira vez, desde então, que essa medida é adotada. Neste momento, o Risoleta não tem condições estruturais e de espaço físico para receber novos pacientes”, informou o hospital.

O Risoleta notificou a superlotação à Rede de Urgência e Emergência de BH, solicitando apoio para encaminhar parte dos pacientes a outras unidades do Sistema Único de Saúde (SUS-BH). Por enquanto, o pronto-socorro está adotando medidas de apoio diagnóstico e outros recursos para possibilitar mais altas hospitalares. “O Hospital Risoleta lamenta o desconforto gerado para a população de referência neste momento, mas reafirma seu compromisso de, mesmo diante de todos os desafios, prestar uma assistência aos pacientes com segurança e qualidade”, afirmou a direção.

Cirurgias suspensas e rede não emergencial do SUS-BH como reforço

Também nesta quarta-feira (22 de janeiro), todos os hospitais não emergenciais da rede do Sistema Único de Saúde (SUS-BH) começaram a priorizar cirurgias ortopédicas de urgência, que têm sobrecarregado a rede e causado superlotação no Risoleta. A medida foi definida por um ofício assinado pela Regulação do Acesso Hospitalar da Saúde de Belo Horizonte, ao qual tivemos acesso, suspendendo a realização de cirurgias eletivas do tipo por duas semanas.

A interrupção dos procedimentos ocorre simultaneamente ao fechamento do bloco cirúrgico do Hospital Maria Amélia Lins (HMAL), na região Centro-Sul, onde parte das cirurgias vem sendo cancelada desde o final de dezembro. A última vez que o Executivo precisou suspender tratamentos cirúrgicos foi durante a pandemia de covid-19, em um cenário de crise global.

O ofício foi enviado aos diretores de sete hospitais: Baleia, Clínicas (UFMG), Evangélico, Célio de Castro, São Francisco de Assis, Universitário Ciências Médicas e Santa Casa de BH. 

De acordo com a PBH, a fila atual é de uma média diária de 100 pacientes que precisam de leito ortopédico de urgência. Em duas semanas, logo, o número é de no mínimo 1.400 cirurgias. “Por isso a necessidade da implementação dessa medida, de forma a garantir atendimento ágil aos pacientes graves. A estratégia faz parte de um plano de ações regular da Secretaria Municipal de Saúde sempre que há maior demanda de leitos ortopédicos no município”, argumenta o Executivo.